Como foi a vinda do Museu Rodin para Salvador? Porque a Bahia não estava na relação das cidades candidatas. Pois é, as cidades eram Recife, Fortaleza e São Paulo. Aí convidei o Jacques Villain para conhecer a Bahia e ele se encantou. Era verão, almoçamos no Trapiche Adelaide e saímos andando pela cidade. O Jacques parou uma hora e disse assim: ‘Esse é um lugar para ter um Museu Rodin na América Latina’. Fingi que não dei importância, mas tratei logo de ir cantando ele aos pouquinhos. Quando falei com ACM, ele achou maravilhoso, e começamos a trabalhar. Mas o que foi decisivo foi a visita do ministro de Cultura da França à exposição A Porta do Inferno (obra de Rodin) na Pinacoteca.
A vinda das obras foi tumultuada. Foi, mas não era para ser. Teve uma burocracia que culminou nessa confusão toda. Houve também a incompreensão de muitos baianos. Mexeu com o ego deles porque a Bahia tinha um certo caráter internacional.
E não tem mais? Não. Perdeu ao longo dos anos. Acho que há um enfoque errado no turismo baiano. A Bahia foi folclorizada e a Bahia não precisa dessa folclorização que estereotipa tudo, da baiana de acarajé aos capoeiristas.
O que fazer para recuperar o prestígio? Acho difícil. Até porque exigiria muitos recursos. O que sei é que houve um movimento de teatro muito intenso, que gerou nomes como Lázaro Ramos, e parece que acabou. Acabou a arte aqui. Onde está a memória de Genaro de Carvalho, de Jenner Augusto, de Mario Cravo?
A Bahia trata mal seus artistas? Trata. A Bahia tem um lado que é maior que qualquer coisa, ele impera sobre todas as coisas, tem seu próprio sistema, seus próprios meios. Às vezes, pode ser mãe, em outras pode ser madrasta.
Foi mãe ou madrasta com o senhor? Acho que sempre tive medo de saber. Por isso fui para São Paulo, porque lá estava protegido. A Bahia tem uma coisa: por mais que você queira dela, ela te nega. Fico pensando na condessa Luana de Noailles, em Carlos Bastos, em Genaro de Carvalho… Vejo que a Bahia foi tão madrasta com eles. A Bahia é madrasta.
(publicado na Revista Muito de 17/11/2009)
3 comentários:
Esse silêncio mortal sobre o que disse esse lúcido, necessário e essencial artista baiano - mas que aqui não encontrou guarida para seu gênio - é sintomático. A Bahia é século XVI. Em tudo. Quem nos salvará da inanição? Os que têm a coragem de se expressar em alto e bom som transformam-se logo em inimigos do rei. Amém
E viva Gregório de Matos, ainda tão infelizmente atual e vedadeiro. Sair do século XVI já seria um adianto. Não nos encaixarmos nas críticas do Boca do Inferno já seria um adianto. Mas parece que não adianta...
Quando li essa entrevista, me senti momentaneamente confortado. Constatar que uma pessoa que está fora tem percepções semelhantes as nossas, nos traz a sensação de não sermos os únicos "malucos"...
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