terça-feira, setembro 29, 2009

habemus site!



O Teatro NU está num momento prolífico. Depois de mais de três anos de um blog que movimentou muitas discussões, finalmente teremos um site.

A partir de uma idéia de Jussilene Santana, atenta às novas mídias, estreamos o blog dia 16 de junho de 2006 com reportagens dela sobre os 50 anos da Escola de Teatro. De lá pra cá, montamos peças, seminários, leituras, e sempre alimentando o blog com diversas discussões sobre cultura e sociedade.

A próxima etapa foi comprar um domínio. Com o teatronu.com passamos a ter um endereço, emails, e assim poderíamos garantir o site quando resolvêssemos tê-lo. Sai gente, entra gente, e começamos a sentir a necessidade de um site oficial, com informações do grupo, formatadas num aspecto mais “profissional”. Renata Berenstein assume diversas funções dentro do grupo e, depois de várias tentativas, ela indica alguém pra finalmente resolver essa “aparência virtual” do Teatro NU.

Aliado a isso, a marca criada por Gaio Matos – artista plástico que nos acompanhou por mais de dois anos em nossas produções – estava muito associada ao trabalho dele, agora em outra fase. A marca possuía, também, uma resolução de cores que era complicada e perturbar ele sempre pra resolver a marca a depender da peça gráfica ia ser incômodo. Uniu-se a isso o fato de Guto Chaves se tornar nosso designer gráfico. Com ele, veio o entusiasmo em efetivar essa identidade visual, criar um estilo gráfico condizente com a estética do grupo, e surge a vontade/necessidade da marca nova.

A marca veio ligada a conceitos sobre o grupo e foi facilmente aceita por todos. Estávamos entrando num novo momento nessa comemoração de três anos de uma idéia de teatro para a cidade de Salvador.

A duras penas, vamos conseguindo romper cercos internos e ampliando fronteiras. Virtualmente, o blog já era visitado por quase cem pessoas ao dia, de diversos países – notadamente, claro, do Brasil e de Portugal. Materialmente, nosso espetáculo Os Javalis está viajando pra um festival em Fortaleza e depois segue para o interior do estado. Além disso, estamos realizando o Diálogos sobre dramaturgia contemporânea, ano I, trazendo para Salvador Newton Moreno, Ramón Griffero, do Chile, e Darío Facal, da Espanha, dramaturgos que estão vindo a salvador discutir dramaturgia. Com esse projeto, nosso propósito é deixar a dramaturgia em foco, através da leitura de peças dos autores citados, bem como saber idéias sobre o drama ao redor do mundo.

É claro que continuamos naquela maratona de perder vários editais, ganhar alguns pouquíssimos, inscrever projetos no Fundo de Cultura do Estado da Bahia, pleitear algum espaço para apresentação, suar pra ter algum reconhecimento, mas as coisas que vêm se somando ao grupo sempre dão novo fôlego.

Temos um site, temos uma marca, temos atores cada vez mais dentro do “projeto Teatro NU”, produtores dedicados, enfim, vamos aos poucos formatando o grupo pra ter uma estrutura melhor e tentar fazer nosso trabalho.

sexta-feira, setembro 18, 2009

Ninguém dorme melhor que os assassinos

Ninguém dorme melhor que os assassinos
Qui, 17 de Setembro de 2009 07:57
texto originalmente publicado na coluna Teatro & Cidade do site http://www.noticiacapital.com.br/



A corrupção será tema eterno dos jornais, das mesas de bar e das salas de estar. Há um componente do “querer se dar bem” que envolve a maioria da sociedade. Mas como dizia o ditado; macaco não olha o próprio rabo.

Há uma tendência natural em se considerar corrupto e criminoso o ato do outro, ao mesmo passo que consideramos esperto o nosso ato. Discutimos as falcatruas do Senado Federal, do Congresso Federal, mas me parece que no fundo há uma inveja subconsciente da pessoa não poder gozar das mesmas benesses.

Poucos são os verdadeiros honestos, dignos e corretos. Basta que se consiga alguma forma de pagar ilicitamente mais barato pela luz, pela TV a cabo, e prontamente a pessoa se aproveita. Recentemente, uma pessoa próxima foi receber seu remédio pelo SUS, e toda uma burocracia havia sido criada para o recebimento da medicação. E soubemos que muitas pessoas estavam falsificando procedimentos pra conseguir o remédio – caríssimo – pra revender. E aí nos pegamos criticando a burocracia que muitas vezes é criada por conta de nossa própria desonestidade. E a culpa é sempre dos outros.

Podemos até pensar que somos café pequeno. Que os poderosos, os políticos, os juízes conseguem roubar bem mais e melhor do que a gente. E há uma verdade nisso. Acho até que o crime político deveria ter penas duríssimas, prisão perpétua, pena de morte, dançar pagode na areia quente do meio-dia durante trinta anos seguidos, nenhuma pena seria muito para um crime político. Quando um cidadão tira a vida do outro, ele tirou a vida de uma pessoa, cometeu algo grave, execrável. E quando um político – através da máfia das ambulâncias – desvia verbas, deixa de colocar na rua um número considerável e necessário de um equipamento para salvar pessoas, quantas vidas se vão aí? Quando um homem não divide sua água com seu vizinho por mera questão de poder, ele pode estar debilitando e até matando uma família. E quando vemos políticos se locupletando por conta da indústria da seca?

O problema é que nossa corrupção do dia-a-dia, que julgamos ser uma esperteza, uma forma de levar vantagem, vai sendo somada ao ato hediondo de outras pessoas. Quando esse montante vai sendo somado a um “gato” de luz, que vai sendo somado a carteiras de estudante falsas, mais um superfaturamento de um orçamento, somados a favorecimentos, troca de favores, quando deixamos de devolver um troco errado, quando usamos de amizades pra ter contas e multas suspensas. Tudo isso somado vira um monstro que devora qualquer possibilidade de uma sociedade um pouco menos injusta.

Está todo mundo errado. É preciso que se diga isso. Os de lá de cima, os poderosos, esses pra mim poderiam ir, em sua maioria, pro paredão. Numa boa. Mas aqui embaixo, a gente, povo, não fica atrás na tentativa – mesmo que fracassada no montante – de se dar bem, tirar proveito, e ser, ao fim e ao cabo, desonesta.

Na área das artes não é diferente. É constante vermos na troca falsa de elogios, na troca interesseira de favores um comportamento que diminui a dignidade e integridade da pessoa. Vemos em vários editais, prêmios, festivais e críticas uma clara evidência de que são grupos se favorecendo, pessoas que empurram as outras pra serem empurradas mais à frente, e a dignidade do artista, do intelectual vai pro brejo. Bastou ter algum poder pra destruir um desafeto e favorecer alguém que pode te dar sexo, ou fama, ou dinheiro – o tráfico de influências nefastas que faz do meio artístico uma espécie de simulacro do que de mais podre existe na sociedade.

É engraçado como artistas têm muitas vezes na mão a possibilidade de mudar a história, de melhorar o nível da arte de sua cidade, de seu estado, de seu país, muitas vezes o poder cai na mão de pessoas que pensávamos serem íntegras e o que acontece? Vemos atos sem nenhum caráter, avaliações, escolhas e decisões ferindo o princípio da legitimidade, merecimento e justiça, enfim, estamos rodeados de pessoas em qualquer área que são corruptas, desonestas. Paremos com essa história de distanciar de nós o que é evidente. E é importante que essas pessoas se sintam assim, saibam que são canalhas, calhordas, inescrupulosas. Basta pensar nas repartições públicas. Se os cargos menores fossem ocupados por pessoas de caráter ilibado, 99% das falcatruas seriam interceptadas e denunciadas. Mas o rabo-preso, de um lado, e a vontade de se locupletar, do outro, fazem de qualquer posição social uma isca para a corrupção.

A cada dia que passa vejo pessoas que eu considerava como honestas, íntegras e responsáveis, entrando nessa vala comum dos jogos da corrupção. Talvez essas pessoas achem isso normal. E pensem que a história não vai registrar seu delito. Mas a justiça vem num cágado aleijado, mas vem. No mesmo passo que o distanciamento histórico poderá revelar que essa confraria da mediocridade, esse cartel de mafiosos da arte, por exemplo, conseguiu atrapalhar carreiras, exaltar o mau-gosto, se confraternizar chafurdando numa lama floreada de elogios, abraços, cachês, troféus e cinismo.

Ninguém dorme melhor que os assassinos. Assim começa o soneto do poeta Ildásio Tavares. Parece que esses senadores, essas comissões, essas curadorias, esses deputados, nenhum deles se preocupa com o fato de estarem destruindo a beleza do mundo. É nessas horas que a beleza do mundo se esconde em atos vistos por poucos, na surdina, enquanto o tráfego de buzinas e atropelos conduz bebadamente seu barco no asfalto da avenida Brasil.




GVT.

terça-feira, setembro 08, 2009

Mea culpa


Acabei de receber um email de Luciano Matos, assessor de comunicação do TCA, onde ele me esclareceu que a cota para divulgação da Série TCA é equitativamente distribuída. Foi um infortúnio, talvez, que no dia de Maria João Pires passasse na TV a divulgação do Buena Vista Social Club. O espaço deste blog não é bélico, nem radical. Tentamos provocar, mesmo sabendo do efeito minúsculo que temos, mas não bato pelo simples prazer de bater e nem sou a favor de críticas equivocadas. Portanto, faço, aqui, um mea culpa. Mesmo achando que poderia-se dar um jeitinho, mesmo que "brasileiro", pra redirecionar a propaganda do Buena Vista, que estava lotado, já, pra Maria João Pires. Mas nem sempre isso é possível, eu bem sei...
GVT.

domingo, setembro 06, 2009

MARIA JOÃO PIRES NA MÃO

MARIA JOÃO PIRES NA MÃO
Sáb, 05 de Setembro de 2009 19:56
texto originalmente publicado na coluna Teatro & Cidade do site http://www.noticiacapital.com.br/






O conceito de arte, e do que é artista, a cada dia que passa se torna mais confuso – recheado de questões que põem a cultura no meio de um ringue onde todos perdem e a arte, coitada, só faz se enfraquecer.

Mas me arrisco a identificar algumas poucas pessoas que para além de exercer seu ofício nas artes eu posso definir como artista; no sentido mais raro da palavra. Uma delas, e das muito poucas, chama-se Maria João Pires.

Fui ao concerto dessa pianista portuguesa, dia 03/09, no Teatro Castro Alves, com a Orquestra Sinfônica da Bahia, e pude sentir uma coisa que poucas vezes sinto. Um estado de êxtase me tomou o corpo, ao ponto de não conseguir nem sequer aplaudir a genialidade dessa artista que estava ali fazendo nada mais do que arte.

O segundo concerto pra piano de Beethoven acabou sendo coadjuvante da maestria com que Maria João debulhava as notas, coloria os sons, acariciava as teclas. Sempre que ouço uma música, tento entrar em sintonia com o que o autor poderia realmente querer com aquela passagem, aquele arpejo, aquela entrada lenta, aquele arremate preciso. E muitas vezes me decepciono ao perceber na interpretação do solista, ou da orquestra, ou nas escolhas do regente uma ineficiência no diálogo com a pretensão da obra. Sim, digo da obra porque nem sempre o autor sabe até onde pode ir aquilo que ele criou. Além de ser, na maioria das vezes, seu pior crítico, o autor muitas vezes pode não ser o melhor intérprete de sua obra.

Era impressionante a generosidade de Maria João em conversar com a orquestra, o diálogo preciso, e seu semblante que discretamente entristecia com uma nota triste e sorria numa passagem exuberante, tudo isso muito bem regido pelo maestro Christopher Warren-Green. E fica aqui uma dica para Ricardo Castro; acorrente este maestro a alguma coluna do teatro e obrigue-o a ficar um ano regendo a orquestra. Impressionante como ele consegue conduzir a OSBA. E isso já era perceptível desde o Mahler que ele regeu em outro concerto até o Rachmaninov que se seguiu ao Beethoven da apresentação do dia 03/09.

O concerto fez parte da Série TCA, um dos poucos projetos interessantes que o governo atual não abortou. Um projeto que há quatorze anos traz a Salvador, numa programação anual, grandes nomes das artes mundiais. E foi numa semana, inclusive, que a Série TCA colocou, em sua programação, duas apresentações de grande porte; além de Maria João Pires, uma velha guarda cubana sob a alcunha de Buena Vista Social Club.

Algumas coisas me vieram à mente essa semana, ainda mais depois de assistir a um concerto como poucas vezes vi aqui ou em outra capital do mundo, com uma pianista que está entre as grandes deste e do outro século; uma artista que, com suas vestes simples, uma saia indiana, contrastava com os cetins e rendas e paetês tão comuns em nossos concertos, em nossas festas de formatura, em nossos casamentos e quinze anos e batizados...

No dia do concerto de Maria João Pires, passou na principal rede de televisão local chamadas para o tal BVSC. À primeira vista, estranho. Primeiro porque se tratava de um concerto dentro do mesmo projeto – o que deveria ser então prioridade para a divulgação de Maria João Pires, já que era no dia de sua apresentação. E, segundo, porque os ingressos para BVSC estavam esgotados para a sessão e para a sessão extra.

Qual a intenção do Governo Estadual e de seus apoiadores ao deixar de divulgar um concerto que – vergonhosamente (e com preços em conta) – estava com pouco mais de meia-casa e com uma excepcional artista no palco, para divulgar algo esgotado?

Como falei no artigo anterior, a mídia venceu a gente. E nada melhor para a mídia do que uma marca. E a marca BVSC é uma marca forte, pois esteve no Oscar, lançou CD, teve produção americana e foi um sucesso estrondoso no mundo quase inteiro. Isso interessa aos apoiadores e ao Governo Estadual, possivelmente; mostrar como eles conseguem trazer para a província essa “marca” de sucesso.

As pessoas consomem marcas, e não qualidade. Todos querem ter tal etiqueta, tal brasão, tal selo em seus objetos de consumo. E as duas sessões de BVSC traduzem muito bem isso. Alguns músicos da velha guarda cubana já estiveram aqui – no Mercado Cultural – sem a marca BVSC, e pouca gente se interessou. Esses grandes músicos de agora seduziram pela marca, e não pela qualidade. O que é uma lástima, visto que a qualidade desses músicos está além e independente do que a massa pretende consumir. Na verdade, as pessoas se interessam em estar presentes ao fenômeno, e não em fruir um objeto artístico.

BVSC está lotado com antecedência e com propaganda na TV. E vai ser um bom espetáculo que, infelizmente, não irei. Maria João Pires foi preterida de chamadas na TV e fez um concerto memorável. Talvez fosse mais interessante pra um governo que pensa em formação, em democratização, em educação e sensibilização, fazer de tudo pra que os baianos pudessem admirar – e para além disso ter as ferramentas para tal, que só a educação e a cultura podem dar – um momento tão especial como o do dia 03/09. Mas é melhor trabalhar com marcas. Com números. Divulgar uma cacetada de editais, uma cacetada de reuniões com representantes de periferias e cidades do interior. Divulgar que o BVSC lotou o TCA.

A arte continua com Pires na mão; e parece que quase ninguém vê.



GVT.