quinta-feira, julho 16, 2009

4. AÇÕES CULTURAIS POLÍTICAS PARTIDÁRIAS




Olha, a quem estamos enganando? Que políticos tentem nos ludibriar com o canto da sereia até é compreensível, mas "NÓS" mesmos já deveríamos ter bastante claro o papel de nossa função na sociedade...

Mas sabe qual o problema nesta frase? O problema é o NÓS... Quem somos NÓS? Quem faz parte desta classe artística hoje?? Sendo mais humilde, então, QUEM é a classe teatral da Bahia? Tá, de Salvador? Acho que este é um outro debate fulcral a que todos que de alguma forma acham que fazem parte deste NÓS deveria enfrentar...

A principal crise que atravessamos não é econômica, mas de representação. Não só no sentido do que a representação diz sobre a legitimidade de quem NOS representa, mas na capacidade mesma de algo/alguém estar num lugar representando OUTROS...O que, infelizmente, nos lembra da própria crise do Teatro Ocidental... (Já escrevi sobre isto aqui no blog em http://www.teatronu.com/2007/07/onde-estamos-ns.html, Se alguém tiver um raro tempo extra, gostaria de convidar para esta leitura de viés, digamos, mais filosófico, conceitual).

Bom, voltando, o governo carlista se notabilizou por INSTRUMENTALIZAR A CULTURA a serviço da propaganda política de uma "Bahia que estava dando certo", e deveríamos ter aprendido mais sobre esta subordinação da cultura a projetos políticos! Os sucessivos governos do PFL encamparam as artes (teatro, música, dança, visuais...) que tinham como TEMA a baianidade e, com elas, produziram a imagem de uma geração. As mesmas artes, mas com outras temáticas, como é sabido, ficaram de fora. Um pesadelo. Já foi tarde.

E a Cultura do Carlismo nos anos 1990, na Era FHC, fez tudo isso praticamente utilizando apenas o mecanismo da renúncia fiscal (FazCultura) com uma obscura e questionável relação de empresas+Secult+produções. Uma caixa-preta que nunca foi devidamente encontrada. Ninguém aguentava mais aquela situação.

Governos de diferentes matizes em diferentes espaços e tempos costumam instrumentalizar a cultura a serviço de suas práticas, seja transformando a cultura em ornamento da sala de estar, seja utilizando-a como arma para provocar a revolução e abolir a diferença entre as castas...Até os jesuítas fizeram isso. Instrumentalizaram a cultura quando descobriram o Brasil à serviço da educação dos gentios.

Agora, quando o atual governo seleciona UM dos inúmeros conceitos de cultura (a saber, o conceito antropológico, inclusivo, que define a cultura como TODA e QUALQUER prática humana. "Acarajé é cultura; Feijoada é cultura..." Soube de projeto para o Fundo de Cultura pedindo verba para feijoada. E isso NÃO é uma gag), a cultura vira a porta de entrada para a inclusão de imensas camadas da sociedade, ela é escolhida como o mecanismo que pode por fim a todas as injustiças. Já que TODOS fazem cultura, Todos estão dentro! Mas e ARTE???

As linguagens artisticas e suas técnicas e práticas saem claramente enfraquecidas deste imbróglio... Claro que existem correntes dentro do próprio mundo artístico que, numa interdisciplinariedade, se servem do conceito antropológico da cultura, para fazer conexão com outras áreas do social.. Mas, note-se: fazer CONEXÃO! Conectar o SOCIAL com o que? Com o MUNDO da arte!! Para isso este, no mínimo, precisa existir! Habitado por técnicas, linguagens e práticas!! Práticas! Não de teoria...

Um dos problemas da Cultura/Wagner é ter recheado demais as camadas da Secult de teóricos....Cultura até se faz no papel, mas ARTE é PRÁTICA!!! É experiência técnica! Imagino que seja até difícil discutir sobre esta obviedade. Quem sabe disso nem fala, quem não sabe acha que é papo de imbecil...

Com medo do que aconteceu no governo Waldir, quando os quadros do Carlismo não sendo afastados continuaram dentro só que implodindo o novo governo, o PT acertadamente limpou a área. Mas, acabou, vítima do eterno BAxVI, jogando a criança fora com a água do banho...Tirou gente competente, técnicos eficientes que HAVIAM SERVIDO ao outro governo...

Uma das lendas que se fala de ACM é a de que ele tinha um faro incrível para a competência técnica. Nas secretarias de administração, planejamento, economia, cultura, educação ele mantinha os técnicos em seu devido lugar. O ambiente jornalístico é polvilhado destas histórias... E aí virava uma questão de consciência, de fórum íntimo, a instrumentalização da técnica, não é mesmo? A quem você serve com seus conhecimentos práticos.

O que acho de mais tragicômico, quase comovente mesmo, é quem embarca na feitura da Política-Cultural dos governos achando que não faz Política...

7 comentários:

Bárbara disse...

Olá Jussilene,
Muito interessante sua reflexão,diante dos problemas que a classe artística enfrenta, a questão do "NÓS" me parece uma das mais inquietantes.No momento digo o que faço: enquanto artista tento me representar, dizer o que eu penso, em um espaço tão rico como este ou a um leigo, mesmo não tendo um mestrado em política cultural ou qualquer coisa do gênero.Sua colocações sobre a instrumentalização da cultura me fazem refletir no caminho das idéias de Walter Beijamim sobre a obra de arte na era da reprodutibilidade técnica. Não estou aqui para fazer juízo de valor com o que fazem da cultura, nem tenho cacife para isso,mas acredito que essa repodução em série do conceito de "cultura" e "arte" influiu para que a arte hoje, com inúmeras ressalvas, saísse do pequeno ciclo da elite que gozava exclusivamente das suas benesses e transitasse sob as as camadas sociais,chegando à grande massa,mesmo sem a sua "áurea" original.Acredito que um artista é por natureza um ser politizado, seus trabalhos refletem e resignificam o mundo.E é por isso que eu sonho tanto com o dia em que "NÓS" deixaremos a primeira pessoa do plural e seremos todas as vozes da ação.
Um abraço!

Bárbara Luci disse...

Uma retratação:o termo "áurea", muito difundido na filosfia esotérica(rs)e utilizado por mim,não corresponde ao termo "aura" utilizado por Benjamim.Quando ele se referia à perda da "substância original" no processo de reprodução da arte.
valeu!

Jussilene Santana disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jussilene Santana disse...

Oi, Bárbara,

Política E arte. Arte E política... Como notaria um professor meu, este E não existe aí à toa. Aparentemente tenta UNIR o que, afinal, se encontra separado.

E por que? Porque cada um destes campos possui história, atividades e tradições diferentes. Vez ou outra há encontros, paqueras, duradouros casamentos..., mas seus respectivos "agentes (os artistas/ os políticos)" atuam com instrumentos e técnicas bastante peculiares. E com objetivos bastante diferentes. Basta falar sobre a diferença de se lidar com a fantasia...

Me interesso pelo potencial libertador da Arte. Talvez fosse melhor dizer: O que me interessa na arte é exatamente seu potencial libertador! A capacidade arrebatadora que uma obra, produção, evento tem de ampliar nossa consciência e sensibilidade e, quase que magicamente, nos mostrar um novo mundo, olhar para a humanidade de uma nova maneira.

Só não acredito que isto se confunde com fazer política, muito menos política partidária, ligada a este ou aquele partido. A arte e suas qualidades, por si, provocam verdadeiras revoluções! Só que (in)felizmente revoluções pessoais. E é muitas vezes neste impacto tão grande que você percebe que: NÃO HÁ partidos...

Sobre este assunto, me conformo com o que os acontecimentos históricos já ensinaram: quando a política se mete na arte, geralmente se faz má política. E péssima arte.

E quando digo que a grande conquista é a revolução pessoal, não digo que os produtos artísticos por isso NÃO DEVAM ser divulgados em massa (sejam eles reproduzidos mediaticamente - através do cinema, rádio, tv.. - ou não, através de outras formas de popularização) , mas só que não há garantias de que a transformação será massificada. A arte, ao contrário da política, não trabalha com garantias...

Já havia observado sua participação por aqui. Vamos palavreando... !
grande abraço,

Jussilene

daniela castro disse...

Jussilene, vc também poderia ter citado o uso da cultura como instrumento de comunicação empresarial, apiando empresas e fortalecendo marcas. como instrumento de marketing mesmo..abraços

saniela castro

Bárbara disse...

Olá ju, obrigada pelas boas- vindas! Concordo que a arte e a plítica (partidária)não devem se misturar, mas penso que a arte, enquanto aparelho ideológico, não está muito distante da política não...Falando de teatro, que eu adoro,quando lembro do teatro grego(a exemplo das tragédias,com os princípios de instrução dos cidadãos,e até mesmo a comédia, mostrando os "vícios" do homem)o que vejo é um exercício de comunicação ideologia e até mesmo de transmissão de um "modus vivendi".Hoje, para mim, não é diferente... nas novelas,nas músicas, nos quadros e principalmente no cinema, há uma idéia a ser trnsmitida, difundida e aceita na sociedade... e isso pra mim é política. O que me parece que varia são os interesses velados na obra,o que acaba defindo se ela é partidária ou não. O teatro do oprimido toma partido dos oprimidos do sistema capitalista,o drama burgês, da classe burguesa, o hip Hop daqueles que são marginalizados... e por aí vai... mas o que eu quero dizer é que em todas as manifestações artísticas, cada uma com a sua caracterítica,existe uma verdade,uma idéia ou até um posicionamento sobre esse "estar" no mundo e como se relacionar com ele.Pois é dessa variável que se contrói a vida, a cultura,as pessoas, o conhecimento e sobretudo a arte!
Um abraço!

Jussilene Santana disse...

Oi, Bárbara,

Gente com energia e mente aberta, como você, são bem vindos aqui sempre!

Mas, hummm, não sei se concordo muito com essa sua argumentação de caráter sócio-histórico para defender uma pretensa coesão entre arte e política...

Deixa eu te "responder" com outras perguntas:

Por que será que hoje, em pleno governo Lula, é possível nos emocionarmos com uma tragédia como Édipo Rei ou Antígona, escritas no governo do grego Péricles?

Por que será que ainda hoje compreendemos a dor de Hamlet ou de Romeu sem estarmos sob o reinado de Elisabeth I?

Por que o Hip Hop, que, sim, nasceu nos guetos abandonados dos EUA, conquistou literalmente o mundo e ouvintes com diferentes poderes aquisitivos? E que, paradoxalmente, hoje tem os artistas mais bem pagos do show business?!

Não será exatamente porque existe ALGO em cada uma destes produtos poéticos que é independente e mais duradouro que a "situação/conjuntura" política que os gerou?

Grande beijo, Jussi