terça-feira, maio 29, 2007

Salvador: teatro e público

Mais um xópim foi aberto. Agora, com o nome de nossa cidade de todos os santos. Um fato curioso ocorreu-me, e só a mim, dentre meus interlocutores.
Está divulgado que serão abertas salas mis de cinema neste suntuoso espaço de consumo, mas, em nenhum momento, ocorreu-lhes a pergunta: “por que não um teatro?”?
No Rio de Janeiro, os xópins têm inaugurado teatros em seus interiores numa valorização da arte e num espaço onde – ao fim de uma exaustiva rodada de compras, lanches, passeios –, o “consumidor” pode se deleitar com um pouco de arte. E num ambiente seguro, refrigerado e com estacionamento.
Por que será que ninguém se perguntou sobre uma sala de teatro no atual xópim? Está cada vez mais comum se concentrar todos os costumes do cidadão comum nestes estabelecimentos que – com seus ares-condicionados – resumem as necessidades do homem atual. De cerveja a acarajé, de cafés especiais a revistas, de farmácias a cinema, temos tudo nos xópins, menos teatro.
Contudo, entra aqui uma outra questão. Pra meu infortúnio e de alguns outros, o teatro não faz parte da vida soteropolitana. Não é programa de fim-de-semana de ninguém. O próprio xópim é o reduto daquele bando de classe média que diz não ter nada pra fazer na cidade (esquecendo-se também dos museus, concertos gratuitos, etc.).
Afora alguns sucessos e alguns nomes chamativos que atraem a massa, não há tradição e nem vontade de se ir ao teatro. Ouço muito pessoas dizerem que depois de uma semana estafante de trabalho, elas precisam descansar, estão exaustas, querem relaxar. Então preferem um xópim, um cinema, um caranguejo, uma praia ou um Faustão.
Mas algumas questões são intrigantes. Em São Paulo, Berlim e Nova Iorque as pessoas trabalham menos do que as baianas? Será que lá eles não precisam relaxar? Será que o trabalho do baiano (que sempre que pode, emenda com uma cervejinha depois) é tão mais desgastante e avassalador do que em outras capitais?
Ocorre-me várias vezes de encontrar com amigos e conhecidos que me dizem: “estou acompanhando seu sucesso, vejo sempre seu nome no jornal”. Afora a desproporção quanto ao jornal, é curioso ver como as pessoas nem cogitam a possibilidade de assistir a uma peça sua, é algo fora da realidade. E muitas quando vão, ou não vão, tratam a ida ou não ida como um ato de educação e gentileza.
O teatro é uma ferramenta política, no sentido mais lato da polis. É uma tribuna onde as discussões sobre o homem são colocadas, questionadas, expostas e criticadas. Com humor, com drama, com ação, com absurdo, o homem vai ao teatro – ou deveria ir – como Édipo foi à esfinge; para se decifrar.
Almeida Garret, escritor português, dizia mais um menos isso: “o teatro é um avançado meio de civilização, mas não progride onde não a há”.
E não temos teatro no xópim.

domingo, maio 13, 2007

Artigo gentilmente cedido por Ildásio Tavares, publicado na Tribuna da Bahia de sábado, dia 12 de maio de 2007

TEMPO PARTIDO
Ildásio Tavares

Não é, Drummond, um poeta da minha predileção. Já foi. Até os 30 anos, mais ou menos quando me exilei nos Estados Unidos e fiz meu mestrado em literatura de língua inglesa, aguçando minha percepção. Mas é inegável que este azedo bardo mineiro produziu alguns poemas significativos para a época – com verdades incômodas. Num desses , ele fala em um tempo partido, tempo de homens partidos. Este poema me impressionou quando eu tinha 18 anos. Na verdade, o texto explora uma conotação do primeiro grau. Partido (político) conota quebrado (partido), e se esgota aí Um recurso fácil, um trocadilho bobo, mas eficaz,para censurar a desunião.
Entretanto, os partidos políticos cada vez mais se fragmentam; se dispersam política e ideologicamente, assumindo a característica de verdadeiros samba-enredos do carnaval carioca, uma música de fachada dividida com inúmeros parceiros, cada um reclamando a autoria do samba.Não há um só partido político que possua verdadeiramente uma fisionomia, uma plataforma, um projeto.
Todos não passam de agrupamentos heterogêneos, dançando de acordo com a valsa fisiológica da conquista do poder e, lá em cima, do frevo da manutenção. Ninguém quer governar coisa nenhuma.
Farinha pouca, meu pirão primeiro, bradam os sobrinhos de Jânio,. O avanço ao cabide de empregos chega a fazer vergonha. O Brasil que se dane. Nada pode ser feito enquanto o país não é loteado pelos vorazes membros do MSC, Movimento Sem Cargo, antes relegados ao ostracismo da oposição, agora situação, querendo emprego no grito e no tapa, indiferentes ao quesito competência. Começa a caça às bruxas e a pichação. Na época da Ditadura, por dá cá aquela pedra, o cara era tachado de comunista e, no mínimo, sofria o vexame de um interrogatório. Agora o piche é carlista. Ele é carlista, vocifera o postulante, como recurso imediato para desobstruir o cargo desejado.
Uma das praxes socialistas é a de suprir o talento individual com o talento partidário, numa transposição da luta de classes do plano econômico para o intelectual, os medíocres unindo-se contra uma pessoa de talento que, por esse falso socialismo, não deve ter cargos nem privilégios. Na Revolução Cultural, Mao botou filósofos e cientistas de alto nível pra limpar cocô de cavalo em estrebarias. A sorte foi que não botou cavalariços para filosofar Bastava ele.
Há algum tempo atrás, o poeta Capinan, uma das melhores cabeças deste país, concorria ao cargo de secretário do então PCB, o partidão. O outro candidato era um zeloso militante, mas intelectualmente medíocre. Um destacado comunista, em conversa comigo, disse que ia votar neste último. Intrigado, aleguei que Capinan era muito mais dotado que o outro, além de ter representatividade nacional. “Por isso mesmo,” o impávido eleitor redargüiu, “Capinan não precisa do cargo” Esta lógica de privilegiar o clero ,compensando com cargos a falta de talento é um dos fatores da derrocada do socialismo real.Drummond estava certo. Inteiro, só mesmo o Partido Alto.

segunda-feira, maio 07, 2007

Jussilene Santana em cena de Os Amantes II (foto de Andréa Viana)


Jussilene Santana em Leitura de Senhorita JULIA

Olá, em breve, estaremos aqui divulgando o CICLO de LEITURAS do TEATRO NU 2007.
Enquanto isso, apreciem a leitura de um clássico da dramaturgia universal com Senhorita Júlia, de August Strindberg, com direção de Ewald Hackler, na Caixa Cultural, nesta quinta, 10 de maio, 'as 18h30. Local: Carlos Gomes.
ESPERAMOS VOCES LÁ!
Segue a matéria de divulgação:

Atriz do TeatroNU na Série de Leituras Dramáticas da Caixa Cultural Salvador
Jussilene Santana participa do evento que resgata a memória do Grande Teatro Tupi

A atriz Jussilene Santana, em cartaz com a peça Shopping and Fucking, de Fernando Guerreiro, participa da leitura de Senhorita Júlia, de August Strindberg, com direção de Ewald Hackler, nesta quinta-feira, 10 de maio, às 18h30, na Caixa Cultural, na Carlos Gomes. O evento faz parte da mostra O Grande Teatro Tupi, uma exposição fotográfica que reúne cenas do teleteatro que existiu entre os anos 50 e 60, na extinta TV Tupi do Rio de Janeiro. Participaram do teleteatro nomes como Fernanda Montenegro, Sérgio Britto, Ítalo Rossi e Nathalia Timberg, esta última que vem à cidade para falar sobre o “Grande Teatro”.

Em Salvador, Jussilene estreou Senhorita Júlia, em 2003, contracenando com Agnaldo Lopes e Lika Ferraro, numa primeira montagem, e depois com Cristiana Ferreira. Nesta nova leitura, participam a atriz Vivianne Laert e Osvaldo Neto.

Idealizado por Guilherme Figueiredo, o Grande Teatro Tupi foi o primeiro programa a exibir encenações dramáticas na televisão brasileira – numa época em que as transmissões ao vivo eram obrigatórias, por falta de tecnologia para registro de imagens. Mesmo depois da chegada do videotape, não havia, na maioria das emissoras, a cultura do registro histórico. No próximo dia 29, Jussilene, que é mestre em Artes Cênicas, realiza na Faculdade da Cidade do Salvador, às 11h, a palestra Impressões Modernas, sobre a cobertura teatral nos jornais baianos nas décadas de 50 e 60.

Video de "Senhorita Júlia" na Caixa Cultural - Salvador

quarta-feira, maio 02, 2007

Ionesco, falando sobre o teatro de vanguarda (e parecendo estar mandando recado pra uns e outros...)

"Se não é assimilado por um grande público (o teatro de vanguarda), isso não significa, de jeito nenhum, que não é de vital importância para nossas mentes, e tão necessário como a pesquisa artística, literária e científica. Nós nem sempre sabemos sua utilidade - mas se ele cumpre uma exigência mental, é claramente indispensável. Se este tipo de drama tem uma platéia de cinquenta pessoas toda noite (e pode ter este número) sua necessidade está provada. Este tipo de teatro está em perigo. Política, apatia, maldade e inveja são, infelizmente, ameaças perigosas de todos os lados para escritores como Beckett, Vauthier..."*

Na minha opinião, vou mais além. Nos tempos atuais, onde a informação chega mais rápido e as experiências são cada vez mais divulgadas, criando um público mais atento e com uma leitura mais transversal, o teatro de vanguarda - se é que posso chamar assim - pode e tem como chegar ao grande público. Existe um grande público que adoraria e poderia ser fisgado por este teatro, mas a falta de incentivo, de políticas públicas, de divulgação e de boa vontade dos formadores de opinião faz com que a desarticulação enfraqueça um teatro que continua em perigo. Ainda mais na província, onde as informações não chegam, onde os nomes de dramaturgos soam estranhos, onde os meios de comunicação se perdem em seus fins, onde ainda importa mais ter feito uma novela do que ter ganho um prêmio em Cannes.
Este teatro, sendo de vanguarda, sendo experimental, sendo alternativo, sendo tradicional, chamem como quiser, não pode ser o único, mas também não pode ser alijado. Parece que os que pesquisam, estudam, experimentam, treinam e se aprimoram são os relegados, as exceções, os banidos.
Mas tudo isso pode mudar. Depende, primeiramente, de você que está lendo este texto.


*IONESCO, Eugène. Notes And Counter Notes. Grove Press, Inc. New York, 1964.